Antigo ‘Beco da Poeira’ ainda veste famílias e vendedores de saudade em Fortaleza; confira fotos
Ponto tradicional de comercialização de roupas mudou de lugar há 12 anos, mas enche memória de quem vive na cidade
Foto: Paulo Rocha/Acervo Diário do Nordeste

Calor forte, corredores apertados e sacolas nos braços eram parte da rotina de famílias fortalezenses para renovar o guarda-roupa a baixo custo num ponto de encontro da cidade: o antigo “Beco da Poeira”. Naquele espaço, um novo miniterminal de ônibus deve ser erguido, mas antes disso o Diário do Nordeste convida a um passeio nos boxes de memórias.
No centro dessa jornada, mais de 2 mil permissionários atuaram no lugar entre as Praças José de Alencar e Lagoinha. O movimento começou no final da década de 1980 e durou até 2010, quando a estrutura foi removida para a construção da linha de metrô. Por isso, um “novo Beco da Poeira” precisou ser instalado na Avenida Imperador.
“[O antigo beco] era como se fosse uma casa, onde a gente almoçava, muitos nos ajudavam e todo mundo trabalhando com o mesmo objetivo”, lembra a confeccionista Fátima Queiroz, de 63 anos, que vestiu muitos meninos com a venda de roupa infantil no antigo Beco da Poeira.
Apesar do nome pelo qual se tornou famoso, a estrutura foi registrada como Centro de Pequenos Negócios (CPN), e inaugurada em 1989. Naquela época, o espaço foi cedido para a Associação de Vendedores Autônomos do Estado do Ceará (Aprovace).
Um pouco antes da instalação do CPN foram removidas 53 barracas, pequenos bares, restaurantes, casebres e até motéis, em novembro de 1987. Essa foi a primeira intervenção pública mais relevante no espaço.
Desde então, os ambulantes foram dando vida ao lugar em meio aos tecidos coloridos e gritos de oferta. Com a chegada de mais pontos comerciais e a ampliação das linhas de ônibus, se tornou ponto frequentado por moradores de todos os lados.
“A essência do Beco da Poeira é nessa área de trânsito e foi se consolidando no tempo, quando passou por um processo de intervenção muito forte que modificou as atividades desenvolvidas nessa área”, analisa Eustógio Dantas, doutor em geografia humana e professor na Universidade Federal do Ceará (UFC).

O histórico do centro comercial foi registrado no estudo “Comércio Informal no Centro de Fortaleza: Beco da Poeira e Feira da Sé”, elaborado por pesquisadores da Universidade Federal do Ceará (UFC), e disponível no Acervo Digital de Fortaleza.
Além disso, os momentos de maior destaque – da adesão popular à remoção dos vendedores – ganhou cobertura da imprensa. Os registros foram selecionados pelo Núcleo de Pesquisa do Diário do Nordeste e trazem o Beco da Poeira de volta à memória.

De segunda a sábado, de 7h às 17h, Fátima Queiroz saía do bairro São Cristóvão rumo ao Centro onde começou a trabalhar por volta dos anos 1990. De modo geral, os comerciantes reclamavam do calor e da falta de banheiros no Beco da Poeira.
“Era uma vida corrida, principalmente para quem fabrica e tem que dar atenção em casa. Mas quando a gente quer que o negócio progrida, tem que estar ali vigiando”, pondera. Com o trabalho, Fátima encontrou sustento para a família.
“De primeiro era muito bom, porque a gente vendia que nem água”, analisa ao refletir sobre as dificuldades para se manter no ramo hoje. Fátima atuou no comércio até a mudança de local e a perda do convívio com os colegas.

“Quando a gente saiu de lá, sentimos muito, porque cada um foi para o seu lado e a gente desfez. Passamos muito tempo sem nos ver”, lembra. Muitos foram para o chamado “Esqueleto”, para o novo Beco da Poeira ou outros pontos do Centro, mas Fátima agora opta por se dedicar à fabricação das peças.